- Olha Nina, que engraçado, uma mulher com um vestido bem lindinho andando de capacete! - diz a mãe, observando uma mulher atravessar a rua em uma combinação de vestido rodadinho de bolinha com um capacete enorme.
- Mamãe, você acha que se a moça pudesse te ouvir, ela ia gostar do que você está falando dela? - diz o filho de 7 anos que não estava na conversa, mas que
não perde uma, reproduzindo o que (para minha redenção) já ouviu várias vezes, inclusive mais cedo no mesmo dia quando a irmã tinha notado um homem que andava " engraçado".
- Mas filho, eu não estou falando uma coisa ruim, é só uma observação de uma coisa interessante...
- É, mamãe, mas se fosse você, e você ouvisse alguém falando isso de você, será que você ia ficar feliz?(checkmate).
- Tá certo, filho, não, eu não ficaria. Acho que está errado mesmo fazer observações sobre a maneira como as pessoas estão, são, ou se comportam...
Este, filhinho, é você aos 7 anos. Um menino tão bonzinho e tão " das regras" que as vezes até me espanta. Um meninão que sofre, de verdade e por dentro quando sabe que transgrediu as tais regras e tem que ficar de castigo, ou leva uma bronca (e não acontece muito). Um menino que está tentado crescer, mas lutando com a candura que te é tão peculiar, que sofreu horrores e viveu um drama digno de novela mexicana para arrancar cada um dos primeiras 4 dentes de leite que caíram, te graduando para o mundo dos que tem pelo menos, alguma coisa de adulto! (Os dentes) - E olha, se te fez sofrer porque você morre de medo (de tudo, de aranha a montanha russa, a tirada do dente), em mim doeu muito mais saber que cada coisa que acontece com você a cada dia é sem volta... que eu nunca mais vou segurar sua mão enquanto papai te arranca seu primeiro dente mole, que eu nunca mais vou ver você terminando com orgulho, apesar da preguiça, seu primeiro livro inteirinho, que eu não vou te abraçar e cobrir seu olho pra você chegar vivo até o fim da sua primeira montanha russa, que o seu mundo de "primeiros"está oficialmente ficando pra trás, junto com a primeira série, o primeiro dia de escola... eu sei que ainda terão outros primeiros, mas eles serão cada vez menos nossos, e cada vez mais seus (não vou dividir seu primeiro beijo, prometo! - Quer dizer... se eu estiver por perto e puder ficar espiando escondida... quem sabe? - Tá, tá, tá...) - mas eu espero, pelo menos, poder ainda segurar sua mão por muitos segundos, terceiros, milésimos medos, sucessos, derrotas, conquistas e caminhos.
Você aos sete anos está tendo cada vez mais consciência de que existe uma vida ficando pra trás, enquanto outra se abre pela frente... e talvez o meu sofrimento ao te ver crescer tão rápido, te faça até ter umas crises do tipo "eu preciso guardar todas as minhas roupas para o Teco (seu boneco companheiro desde 1 ano), porque ele também vai crescer, mamãe!". Isso, alternado com surtos de maturidade como este mencionado aí em cima, brigas absurdas com sua irmã pra ver quem aperta o botão do elevador (o de dentro, porque o de fora subitamente foi desclassificado como uma atividade competitiva...), alternado com um cuidado extremo com a mesma irmã, que você carrega no colo quando ela está nervosa e só você serve, que faz massagem pra sarar as dores de crescimento que não a deixam dormir a noite, que você acha e sabe as atividades que vão fazê-la feliz, e pisca pra mim quando ela, que estava chorando, abre a maior gargalhada com uma palhaçada sua, como quem diz: "viu mamãe, deixa comigo que eu sei cuidar dela!". E é fato, você sabe.
Você aos sete anos é um menino que me irrita, ao mesmo tempo que me encanta quando em 100% das vezes que eu digo alguma coisa, pergunta:
- Mas como você sabe? ou - Mas por que? - sendo que os porquês de 7 anos não se explicam com uma resposta vaga, e obviamente não com um "porque sim". Os porquês de 7 anos precisam de prova, meus caros! Evidência, registro em cartório, significância estatística e fotos.
E que já sabe que a resposta para esta pergunta, ou para as que eu não sei (que você já descobriu, são muitas) é sempre: "porque eu pesquisei"ou "então vamos pesquisar!" - e foi assim que você conclui sozinho recentemente que o meu trabalho, de pesquisadora, consiste em consultar o Google. Certo, precisamos retificar essa situação antes que o governo descubra e corte minha bolsa, né não?
Meu grandão, você aos 7 anos me faz sentir cada vez mais inteira, com aquele senso de ter feito alguma coisa certa, mesmo fazendo tantas erradas, e deve ter a ver 7 anos ser também o número da perfeição. Você aos 7 anos perdeu aquelas bochechas que te faziam naturalmente fofo até uns anos atrás, perdeu as palavras faladas erradas que te faziam engraçadinho, ganhou uns dentões desproporcionalmente grandes e tortos, perdeu o fator "engana troxa"que aceita qualquer resposta, e o que sobrou, e cada vez sobrará, começa a ser você mesmo! Coisa estranha essa de você ser você, sabe? De começar a se identificar como uma pessoa todinha pessoa. Uma pessoa que toma banho sozinho, que sabe até fazer seu próprio café da manhã! Que sabe achar respostas no Google, que consegue ler e entender as regras de um jogo sozinho (e bom, é evidente que você é uma pessoa que gosta de jogos de tabuleiro!), uma pessoa que escolheu como tema da festa "Livros" e encarou de boa a ideia de fazer uma troca de livros ao invés de ganhar presentes, uma pessoa que vai ser com certeza jogador de basquete, ou inventor (e quem nunca?) ou médico, ou palhaço, uma pessoa que é o melhor companheiro pra assistir reality shows (Amazing Race ou Extreme Makeover Home edition), uma pessoa que decide que "não vai comer carne mesmo, nem quando o papai falar que pode, mamãe, porque faz mal pra saúde, né?"(mas que claramente ignora este pensamento se estiver no McDonald's... porque nem meninos perfeitos são perfeitos, né?), uma pessoa que, aliás, come qualquer coisa (até suco de couve com mirtilho e chia) se eu falar que vai ser bom pra saúde, uma pessoa que chora sem pudor, que morre de rir falando bobeiras para bebezinhos (e que todos os bebezinhos adoram!), uma pessoa que precisa muito de um beijo, uma mãozinha no rosto , um abraço apertado e 3 músicas antes de dormir (ai... talvez essa não dure pra sempre...), uma pessoa muito competitiva (nota para o futuro: culpe seu pai e seu tio por essa!), uma pessoa que se esforça para entender as coisas, mesmo quando elas são difíceis de entender, uma pessoa que enche meu coração, meus dias de alegria e de batuque em tudo que encosta.
Nossa filhinho, tanto orgulho da pessoinha que você está virando, viu? Multiplique a perfeição por mil, tire um pouquinho do medo, porque as vezes a gente precisa encarar umas montanhas russas e um frio na barriga para se sentir mais inteiro; tire um pouquinho da necessidade de ganhar, porque por mais que você sempre vá ser o meu campeão, na vida você vai perder, e não vai ser pouco; deixe a preguiça de lado quando der, porque os melhores livros são grossos e sem figura, fazer caminhadas longas pode ser bom (mesmo que sua mãe não seja um bom exemplo, ah sim, nota para o futuro 2: sua mãe nem sempre é um bom exemplo! Mas leia essa só quando você tiver passado da adolescência, tá?), e pode continuar bagunceiro e com preguiça de dobrar roupa porque eu sempre fui assim e isso não dá nada (desde que você não precise de roupas passadas pra trabalhar, mas olha só, tanto jogador de basquete quanto palhaço não precisam de roupa passada, e inventor e médico podem usar jaleco, então tudo certo!).
Acho que a estrada pra frente é de acrescentar à essa pessoa que já está pré-moldada... e olha que eu nem acabei de ler o livro " Os 7 primeiros anos", que são mesmo os mais essenciais. Diz a neurologia que daqui pra frente, é criar em cima do que já está criado, ao invés de criar o novo como foi até aqui, e eu fico bem feliz de saber que nessa base tem um menino com senso de humor, um menino que respeita os outros, que tem pensamento crítico pra não aceitar qualquer resposta, que é muito criativo, que ama a Deus e tenta sempre fazer o que é certo, mesmo quando é difícil, que é afinado e tem ritmo, que entende que as diferenças são essenciais para um mundo bonito, que entende o que é preciso para uma boa saúde, que fecha a torneira quando está escovando os dentes e sabe reciclar, ... acho que com isso dá pra fazer um samba bom... por mais 7, por mais 70...
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Perfeição! |